Um Moliére Imaginário
A volta do morto vivo
Fotos: Mairla Melo
À sombra da obra do teatro municipal de Uberlândia, projetado pelo bom velhinho Oscar Niemeyer (séria concorrente a completar cem anos em construção), 3500 pessoas (contabilizadas pela PolÃcia Militar) se amontoaram nas arquibancadas da praça cÃvica (umas 90 toneladas de cimento) para ver o orgulho das alterosas: o Grupo Galpão, e seu Um Moliére Imaginário. A última vez que essa peça esteve na cidade, há uns cinco anos, foi apresentada no Center Convention, com direito a platéia chique nas primeiras filas (de vison e smoking, tomando espumante nacional), ocultando os estudantes que economizaram no almoço e colocaram a melhor roupa pra ir à mostra granfina e só conseguiram os últimos lugares. Seria então a minha chance de rever a peça, feita originalmente para ser apresentada nas ruas, em uma praça pública (mesmo que seja no meio de tanta poeira, crianças correndo pra lá e pra cá, em uma arquibancada mal-projetada deixando as bundas quadradas e as pernas formigando).
O grupo mistura o último texto escrito por Moliére, Um doente imaginário (aquele do hipocondrÃaco que quer casar sua filha com um médico), com a vida (ou seria a morte?) do autor (que, de acordo com as más lÃnguas, morreu após uma apresentação da peça), num exercÃcio de metalinguagem em que o autor ressuscita e vem intervir na apresentação. Tudo isso com figurinos barrocos, maquiagem carregada, música (muita música aeh!), interpretações exageradas, num palco que remete a uma trupe mambembe (alguma semelhança com qualquer outra peça do grupo não é mera coincidência).
Uma vez o Coelho escreveu sobre a falta de risco nas montagens do Galpão. A encenação de seus espetáculos parece estar sempre na zona de conforto que os consagrou. É agradável, bonito e engraçado (e de quebra faz pensar no final, hum…). Após rever esse que foi o espetáculo do grupo que me desvirginou, o que era o ponto de comparação com os que viriam depois (o tal risco da encenação) abriu meus olhos pra outro ponto “o risco da interpretação”. O exercÃcio da metalinguagem presente no texto, junto à encenação na rua (sujeita a 250% mais intempéries que na sala do teatro), coloca em jogo as relações personagem-ator-público-teatro-realidade.
A magia do teatro está presente o tempo inteiro na encenação, mas os atores não perdem uma chance sequer de mostrar que aquilo ali é de mentirinha, eles são como todos nós que vão ao banheiro e pagam impostos, sem que para isso tenham que pr eparar uma grande cena para o famoso distanciamento. Os escrúpulos e pudores são eliminados, não porque gente de teatro tem que ser sem-vergonha, mas porque temos o nosso lado capetinha e anjinho.
Rodolfo Vaz, que interpreta o doente Argan, extrapola esse risco zoando de seus colegas de cena, brigando com a platéia, fazendo piadas dos problemas técnicos (como o microfone com chiados da ex-Circo de Soleil Teuda Bara, chamada carinhosamente por ele de elefantinho), antecipando cenas, comentando ações no meio de textos importantes, entre outras sujeiras que deixavam a narradora olhando pro lado, tentando disfarçar o riso. É um mini bufão, aparentemente sem nenhuma direção cênica, conectando (e desconectando) a platéia a um mundo politicamente impossÃvel.
A artificialidade do teatro certinho parece não ter importância. Os números musicais não estão focados no tecnicamente perfeito (como em Um homem é um homem). A mensagem polÃtica não é explÃcita (como em O Inspetor Geral), mas sempre alfinetada com uma piada. As interpretações dos enamorados ultrapassam o limite do amor indo e trágico (como em Romeu e Julieta), expressando, em vez disso, o ridÃculo do romance.
A continuidade dessa peça, há anos e anos rodando o paÃs, mantém o grupo com o pezinho nas suas origens, e mesmo depois de anos de estrada fazem tudo como se fosse a primeira vez, mantendo a tradição de passar o chapéu após o espetáculo (ops, acho que a gente os paga todo dia através dos impostos), humildes em não negar fotos com o público no celular (teve até fila, que eu vi) e com sorrisos simpáticos desinteiraram o meu dinheiro da cerveja (o meu espÃrito consumista adora uma lojinha com DVDs e camisetas).
15 piadinhas com a cidade durante o espetáculo
eu vi vc na fila!!!!!
essas coisas a gente não fala paulinha!
na verdade eu estava fugindo do chapéu.
Meu consultor para assuntos teatrais e culturais….Emiliano Freitas.
Adorei o texto, adoro suas indicações, e principalmente as crÃticas após os espetáculos…Parabéns pelo trabalho aqui, e valeu pela força com as fotos…
beijo
acho que sou um dos maiores “paga-pau”‘s do Galpão. E assistir o “moliére” é realmente um respiro. É perceptÃvele que ali eles se dievrtem e mostram porque o Galpão se tornou o que é hoje, como a Rua foi escola para eles.
(e como sempre.. eu falo, falo, falo e naõ digo nada.)
heheeee
Ah, eu nem acredito que vou apresentar essa peça na escola onde estudo.. Estamos nos esforçando bastante, pois é um grande trabalho! Sei que não vai ficar igual o de vocês, mas estamos nos esforçando muito pra fazermos o melhor, estamos no comecinho ainda, e temos 3 meses para a peça ficar pronta, mas com a ajuda dos prof de portugues, e de pessoas que vão nos ajudar a interpretar melhor, vamos conseguir fazer um trabalho muito bom. Obrigaddo pela peça, quando ficar pronta colocarei no youtube, e divulgarei aqui pra vocês verem como ficou. Obrigado mesmo.